Turquia - 6° dia – Konya e Capadócia



Acordamos às 5 horas da manhã, pois precisávamos fechar as malas, tomar banho e um belo café da manhã, pois passaríamos praticamente todo o dia dentro do ônibus, que saía às 7h da manhã, na maior “perna” da nossa viagem.

Infelizmente o café da manhã não foi ao ar livre (como eu gostaria, afinal o jantar havia sido maravilhoso), e a comida era muito simples mesmo, o que era de se esperar pela estrutura do hotel. Mas o que eles tinham era gostosinho. Como fui antes do Caike para o salão, me sentei perto do Buffet, para garantir que ele me acharia com facilidade, e confesso que fiquei me divertindo enquanto esperava vendo as pessoas tentarem usar a máquina de café/chá/chocolate quente. A máquina tinha uma quantidade realmente grande de botões e duas saídas para os líquidos, então invariavelmente as pessoas erravam e perdiam parte da sua bebida ou faziam lambança.

Terminando o café fui para o ônibus, só para descobrir que tinha tanta gente indo embora no mesmo dia e na mesma hora que parte das malas do nosso grupo (incluindo as nossas) simplesmente ainda não havia chegado. Algumas pessoas ficaram muito preocupadas, achando que elas poderiam ter ido parar em outro ônibus, mas no final deu tudo certo, elas só demoraram mais a chegar mesmo.

A previsão era de ficarmos pelo menos 4 horas e meia dentro do ônibus (sem contar as duas paradas técnicas programadas) até chegar a Konya, a capital espiritual da Turquia. Na primeira parada técnica aproveitamos apenas para ir ao banheiro, pois dormimos direto, com direito a música sufi de fundo, que a nossa guia colocou justamente para a galera poder descansar mais um pouco. Na segunda parada técnica fizemos um lanche/almoço. Paramos num tipo de restaurante, mas que só serve lanchinho, e comemos um prato típico da região: bidê (se fala bidê mesmo!), conhecido também como pizza turca, mas que também lembra uma esfirra aberta. O prato tinha 3 sabores disponíveis: carne, queijo ou misto, e sem saber que a carne era apimentada pedimos o misto, o que foi um erro, pois foi difícil de comer e como eu pedi um chá que veio muito doce, a bebida não ajudou a aliviar o ardido da pimenta.

Vista do Castelo de Algodão ao caminho de Konya...
Aproveitamos novamente para ir ao banheiro, só que o lugar era tão grande que eu me perdi. O inglês tosco dos funcionários também não ajudou em nada. A única vantagem é que eu não paguei para entrar no banheiro, pois entrei pelo lado errado (desconfio que era a entrada dos funcionários) e não passei pelo controle.

Saindo do restaurante e voltando para o ônibus, nossa guia começou a nossa aula sobre o interior da Turquia e o Sufismo, tão presente e importante nessa região. O Sufismo é o lado místico do islamismo e durante muitos anos (e em alguns países até hoje) ele foi proibido por ser considerado uma heresia (no caso da Turquia acredito que ele tenha sido banido pelo Ataturk porque era considerado uma ameaça à laicidade do estado). O Sufismo tem diversas vertentes diferentes, mas na Turquia é muito associado ao poeta e mestre Rumi, que apesar de ser persa e ter nascido numa região que hoje pertence ao Tadjiquistão, ele morou a maior parte da sua vida em Konya, e foi lá que ele escreveu todas as suas obras de importância. Mevlana Jalal ad-Adin Rumi, viveu no século XIII e sua obra influenciou o mundo todo. A maior parte dos grandes pensadores que vieram depois dele leu sua obra e foi influenciado por ela de alguma forma.

Outro personagem importante no folclore dessa região é o famoso Nasrudin, que apesar de ter histórias absolutamente folclóricas, foi um personagem real. Suas anedotas são mundialmente conhecidas e ele encarna o papel do sábio tolo, que assim como o bobo da corte medieval, se utiliza de sua própria tolice para dizer a verdade que ninguém tem coragem de dizer. Mestre Nasrudin também é utilizado no sufismo, onde através de suas anedotas e histórias engraçadas são passados diversos ensinamentos (a tradição oriental sempre foi muito baseada em histórias, e os ensinamentos são passados diversas vezes de forma oral, através de histórias curtas e anedotas).

Para amenizar a chatice do ônibus, nossa guia, Tina, passou as horas depois do almoço contando histórias dele, o que tornou a viagem até Konya muito mais interessante e divertida. Mas chegando a Konya, nós fomos visitar o a escola criada por Rumi, que é mais conhecido por suas poesias, especialmente as de amor.

A escola de Rumi hoje é um museu, e peregrinos sufis e muçulmanos do mundo inteiro vão até lá para rezar no seu túmulo. Com um ambiente agradável e um lindo jardim em torno das construções, hoje se visita o seu túmulo como se fosse mesmo um museu. Seu imenso caixão de pedra, coberto por um tecido verde, fica numa grande sala, juntamente com os caixões de outros mestres e sufis proeminentes, e todos têm turbantes em cima, e o tamanho do turbante indica a importância do morto. Por ser um local de peregrinação, apesar da quantidade imensa de pessoas visitando o museu, a sala permanece em silêncio. É proibido tirar fotos (apesar de algumas pessoas tirarem mesmo assim, especialmente os chineses e japoneses), e muitos aproveitam para orar o mais perto possível de Rumi, e outros aproveitam para orar para as diversas relíquias que também estão dispostas no local.

Museu Rumi
Nos antigos quartos destinados aos sufis que viviam ou visitavam a escola, hoje há uma exposição sobre a cultura sufi, suas vestimentas, hábitos e instrumentos musicais. Ah, sim, os sufis são muito conhecidos pela sua música, e Rumi fundou uma das ordens sufis mais conhecidas do mundo: a ordem dos dervixes rodopiantes. Rumi criou um ritual onde alguns sufis tocavam música, enquanto outros entravam em estado meditativo e em êxtase rodopiando sem parar, tudo sob a tutela de um mestre, que conduz a cerimônia, chamada de Sema na Turquia. Aliás, é dessa cerimônia que deriva a dança egípcia Tanoura.

Nays - flautas de madeira muito usadas na música sufi
Rababas - uma espécie de violino antigo, também muito presentes na música Sufi
Kudum - um dos instrumentos de percussão usados pelos sufis
Infelizmente nossa visita ao museu foi muito curta, e não pude meditar perto do túmulo de Rumi. Além disso, precisei ir ao banheiro, que tinha uma fila simplesmente gigantesca, e acabei também não podendo aproveitar o jardim do museu... pelo menos na saída consegui comprar uma das obras de Rumi que é muito difícil de encontrar.

O jardim do museu
Um exemplo da sua poesia:

Seja como o sol pela graça e misericórdia
Seja como a noite para cobrir as faltas dos outros
Seja como a água corrente pela generosidade
Seja como a morte para a raiva e o ódio
Seja como a terra pela modéstia
Pareça ser aquilo que você é
Seja aquilo que você parece ser

É ou não é apaixonante?

Aproveitando o clima do museu, nossa guia, Tina, aproveitou para ler alguns dos seus poemas durante o resto da viagem para a Capadócia. Dessa vez, fizemos apenas uma parada técnica antes de ir para o nosso hotel. Nessa parada aproveitamos para lanchar, eu e o Caike pedimos uma tost (um tipo de sanduíche na chapa), e eu pedi minha bebida turca favorita: o ayran. O serviço do lugar era muito confuso, e foi complicado conseguir o nosso lanche. Quando a Tina me viu com aquele copo de iogurte na mão ela comentou que eu estava realmente parecendo uma turca, visto que a maioria dos turistas não gosta dessa bebida salgada.

Chegando na Capadócia, pela primeira vez o grupo se dividiu, pois parte do grupo havia pago o adicional para ficar no hotel da caverna, enquanto os outros ficariam num hotel comum. Por isso aqueles que ficariam nos hotéis das cavernas (um grupo de paulistas escolheu um hotel diferente daquele sugerido pela agência de viagens, apesar dos hotéis serem um do lado do outro) seguiram viagem numa van, enquanto o resto seguiu no ônibus junto com a guia e Selim, nosso motorista.

A Capadócia vista do nosso hotel
Agora vou dizer uma coisa: valeu cada centavo o extra que pagamos pelo hotel na caverna. É o hotel mais chique que já fiquei ou vi ao vivo. Era tão chique que fomos recebidos com uma linda bebida gelada feita com especiariais! O hotel em si era uma atração! Encravado numa montanha, com absolutamente todos os cômodos feitos de pedra, o hotel era um luxo só! E não só na construção e na vista simplesmente divina, mas também nos detalhes, tudo dentro do hotel era lindo. Ele era bem decorado, o serviço impecável, e o quarto... nossa! O que era aquilo! O banheiro era gigantesco e tinha uma jacuzzi imensa para duas pessoas e um chuveiro daqueles bem modernos, com jatos de água saindo das paredes.

A recepção do nosso hotel
Fomos recebidos com uma bebida gelada a base de especiarias que era uma delícia!
A decoração do hotel era uma atração à parte, e atrás do hotel vemos as antigas cavernas usadas por séculos pelos moradores da região
Como ainda tínhamos que jantar antes do show da dança que assistiríamos a noite, tomamos banho no chuveiro modernoso, o que foi uma experiência muito interessante, pois ajustar os jatos para eles baterem nos locais certos o não na sua cara não é uma tarefa tão simples assim. E como eu e o Caike temos alturas muito diferentes, cada um precisou ajustar o chuveiro para si.

Apesar de termos combinado com outras pessoas que estavam na nossa excursão para jantarmos juntos, quando chegamos no local combinado não havia ninguém, e como na espécie de barzinho aberto estava muito quente e ventava muito, resolvemos jantar no restaurante do hotel. O cardápio era extremamente variado e não era proibitivo, apesar do restaurante ser absurdamente chique. Eu pedi um kebab (todo prato com carne se chama kebab na Turquia) ao molho de iogurte com ervas e purê de berinjela, que estava tão divino que nem dá para descrever. O Caike pediu um prato típico turco: o kebab de pote. Esse prato tem uma apresentação realmente única: o kebab é cozido dentro de um pote de barro, que precisa ser quebrado para se servir da carne feita no molho de tomate e especiarias. É realmente algo bonito se ver, apesar de eu ter preferido o sabor do meu prato.

Nosso jantar super chique! Repare no pote de barro no prato do Caike
Terminando o jantar, encontramos os demais turistas para pegar o nosso transfer para o show de danças típicas no Harmandali. O transfer era uma van muito modernosa, cheia de luzes coloridas por dentro e o interior imitava madeira. A idéia era ser chique, mas o resultado não era bem esse.
Euzinha na entrada do Harmandali
Eu fiquei super feliz por ter conseguido ir nesse show, pois a estrela da noite não é ninguém menos do que a nossa carioquíssima Clara Sussekind! Eu já conhecia o trabalho da Clara há muitos anos e sempre fui fã, mas desde que ela foi para a Turquia eu só pude vê-la uma vez, e para variar ela havia arrasado no show. Como eu poderia ir à Capadócia e não ver a mais famosa bailarina de dança do ventre atualmente na Turquia??? Até a nossa guia (que a conhece pessoalmente) contou que os turcos vão à Capadócia só para assisti-la. E agora ela vai fazer o maior sucesso por aqui também por conta da nova novela da Globo, onde ela aparece dançando...

Enfim, chegamos ao Harmandali, que é na verdade um restaurante com show de danças. O salão onde acontece o show é uma grande arena que lembra um ouriço, pois ao redor da arena tem corredores amplos com níveis onde eles colocam as mesas para as pessoas assistirem o espetáculo. Nesse restaurante se apresentam a Clara e uma companhia de danças folclóricas turcas. E nós ficamos bem de frente para a entrada! O lugar perfeito para ver o show!

Durante o show, os espectadores são servidos com pratos de frutas e alguns petiscos, para serem consumidos à vontade, além de bebidas de todo tipo, tudo à vontade também (incluindo bebidas alcoólicas), eu aproveitei para tomar Raki, um tipo de cachaça feita de anis, conhecida no mundo árabe como arak e na Grécia como uzo.

A nossa mesa ainda desfalcada do pessoal que não ficou no hotel da caverna
A primeira dança foi uma dança da companhia de danças folclóricas, e era uma dança típica de casamento (ou assim pareceu rsrsrsrs), teve muito interação com o público, pois foi escolhida uma mulher da platéia para ser a “noiva” e então ela precisava escolher entre homens (também da platéia) qual seria o “noivo”. A brincadeira teve direito a fazer o público dançar em roda e tudo o mais, os turcos sabem fazer um show!

A dança de casamento
Antes da interação com o público rolou algo parecido com dabke, mas era mais suave...
Depois veio uma apresentação de uma dança de roda, de homens e mulheres, que eu classificaria como dabke turco, pois é feita em linha e a pessoa que está na ponta vai puxando os passos para os demais seguirem segurando um lenço. No final novamente o público foi chamado a participar da roda, e eu fui dançar cheia de raki nas idéia... e a dança turca, assim como o dabke árabe, exige muito das pernas, com muitos agachamentos... novamente foi muito divertido. Em seguida entrou a nossa querida Clara numa tanoura... ah, que coisa linda que é vê-la dançando e rodopiando... fiz questão de filmar!

Esse sim seria o dabke turco, com muito trabalho de pernas e marcação de ritmo!



Logo depois entraram novamente as mulheres do grupo de dança folclórica, interpretando a dança cigana turca! Gente, eu não curto dança cigana, mas amo a dança cigana turca de paixão! Que coisa linda e forte! Adoro os seus movimentos de força pélvicos, a forma como elas batem no próprio corpo e suas expressões! E essa apresentação foi longa, pois depois entraram os homens, fazendo uma dança cigana mista, seguida da representação de um duelo entre ciganos! Eu mencionei que os turcos sabem fazer um bom espetáculo?

Dança cigana turca
Adorei o chapéu cigano dos bailarinos
Depois de toda a emoção, veio um pequeno intervalo, com direito a salsa de música ambiente, e um casal jovem e muito sem noção resolveu se exibir... coisa mais desnecessária... a menina estava um pouco sem graça, mas o rapaz queria mostrar como ele era bom e podia passar a mão na bunda da menina, que estava com uma saia curta digna de baile funk... o grupo deles aplaudiu muito, mas o resto dos espectadores estava meio sem graça. Quando eles se sentaram, um casal de senhores (de uns 60 anos) resolveu mostrar o que é dança de salão de verdade... e gente, que diferença! Tão elegantes... era realmente uma dama e um cavalheiro dançando... lindos de morrer! Foram muito mais aplaudidos.

Depois do intervalo, o show recomeçou com uma apresentação do grupo de dança folclórica, uma apresentação muito feia e ruinzinha de dança do ventre (as bailarinas desse grupo não eram muito boas... sabe bailarina que “não entra em cena”? Fica repetindo mecanicamente a coreografia pensando em outra coisa? Agora acrescente uma técnica visivelmente ruim). E logo depois delas entra novamente a Clara! Não teve para ninguém! Nossa brasileira arrasou com uma linda dança dos 7 véus, seguida de espada, solo de derbake e dança cigana! Clarinha ficou 20 minutos em cena, e saiu com o público pedindo mais!

Uma das coisas mais estranhas que eu já vi... o shimmie delas era de pé! Sério, ao invés de usar os joelhos ou quadril elas usavam mini saltinho para fazer shimmie... algo bem africano na verdade...





Em seguida voltaram as mulheres do grupo de dança folclórica com uma dança muito diferente, todas vestidas de branco e algo que parecia taças e pratos com velas nas mãos. Depois vieram os homens do grupo, para fazer o fechamento do show, e que despedida sensacional que eles fizeram! Foi o momento em que cada bailarino desafiava o outro a fazer algo ainda mais complicado! Esses homens têm pernas, meu deus! Em seguida abriu-se uma espécie de pista de dança, e adivinha o que tocou? Michel Telo!!!! E Conga!!! Eu não sabia se ria, chorava ou dançava.

Dança esquisita...
Resolvi que era melhor correr atrás da Clarinha para bater um papo rápido e tirar pelo menos uma foto com ela!

Eu e Clara Sussekind! Não é uma fofa?
O resto do pessoal do nosso hotel também não ficou muito animado com a pista, e logo estávamos todos de volta no transfer. Chegando ao hotel, e ainda animados com o show da noite, fomos para o tal barzinho ao ar livre do hotel para tomar um çay (chá), quando o sono bateu de verdade, fomos todos dormir... o dia seguinte também prometia!