3 de maio - o "último" dia

Esse seria o último dia do Caike comigo na viagem, na madrugada ele pegaria o translado para o aeroporto e eu continuaria a dormir até a manhã do dia seguinte, continuando a viagem pela França. Por conta do futuro cansaço com as malas que seriam fechadas à noite e da já certa falta de sono, resolvemos que era melhor relaxar um pouco e dormir até mais tarde para descansar o máximo possível, sem perder tempo demais.
Dessa forma, acordamos razoavelmente tarde, e tomamos o café no hotel mesmo, com toda a calma do mundo. Pegamos o metrô e fomos visitar uma igreja que me recomendaram muitíssimo, a Madeleine. Essa construção, de arquitetura neoclássica, demorou para conseguir sair do papel. Inicialmente ela seria construída em meados do século XVIII, para substituir uma igreja consagrada à Madalena que, para variar, tinha se tornado pequena demais para a população da região. Porém, com o advento da revolução francesa, péssima época para construir igrejas, sua construção foi embargada, o terreno vendido, e muitas peças vendidas para artesãos. Mais tarde, Napoleão escolheu a localização para erigir um templo às forças armadas francesas, e escolheu o trabalho de um artista que se baseava nas antigas construções gregas e romanas, porém o templo não chegou a ser terminado por falta de dinheiro. Após a retomada do poder pelos monarquistas, a idéia de construir uma igreja voltou à tona, e depois de muitas idas e vindas com direito a inúmeras adaptações de projeto, em meados do século XIX, a Madeleine foi terminada e consagrada.


Hoje é uma das igrejas mais bonitas da cidade, bem mais baixa que as demais catedrais, pelo menos por fora, com muitas estátuas de santos por todo o lado de fora da igreja, alternando com as colunas neoclássicas. Tudo lotado de detalhes, de forma que não deixa nada a dever às construções góticas. Sua porta principal possui os sete pecados capitais escavados na madeira, e em cima há uma enorme cruz, que à noite se pode ver de uma grande distância por conta da iluminação vermelha.Por dentro a igreja também é neoclássica, lembrando muito o panteão, cheia de colunas e o teto repleto de afrescos. O altar principal é lindo de morrer, com uma lindíssima imagem da Ascenção de Madalena. Inclusive, em termos de estatuária, essa igreja é das mais bonitas que já vi, e também das mais controversas. Logo na entrada há uma coroação da Virgem que você jura de pé junto que é uma cena de casamento, com direito a alianças e tudo, e pelas longas madeixas de nossa senhora ela parece mais Madalena mesmo. Mas essa é outra discussão.
Até a música é diferente na Sainte Madeleine, o órgão aqui toca composições mais alegres e vivas. Posso dizer que foi uma das igrejas que mais me agradou em toda a viagem, com sua atmosfera calma sem ser austera, além de ser razoavelmente iluminada, com um destaque quase que desproporcional para o altar e, por consequência, a figura de Madalena. Aliás, a primeira visão desse altar é de tirar o fôlego, de tão bonita.De lá saímos rejuvenescidos pela beleza da igreja, para novamente pegar o metrô até o bairro da boemia de Paris e cenário do último filme francês de grande sucesso, Amélie Poulain: Montmartre.Descendo na estação, pegamos a primeira saída que vimos, e fiquei sabendo depois, a pior alternativa possível. Montmartre é um morro, o único da cidade, e o metrô continua sempre no mesmo nível. Resultado, pegamos uma escada para sair que não terminava nunca, e vimos vários turistas, e até mesmo parisienses, parando no meio do caminho para descansar, porque era muito difícil subir aquilo tudo de uma vez só, haja fôlego!
Chegando na superfície, pelo menos fomos recompensados pela vista da Place des Abesses, uma pracinha muito linda e bem calma, de cara para uma igreja com fachada art nouveau: Saint-Jean l'Evangéliste, também conhecida como Saint-Jean-de-Montmartre. Paramos para dar uma olhadinha nela, é claro. Essa construção, projetada por um discípulo do arquiteto responsável pela restauração da Notre-Dame, foi erguida durante a virada do século XIX para o XX, com muita influência art nouveau, é uma das raríssimas igrejas consideradas inovadoras datadas de antes da primeira guerra mundial. E ela é muito bonitinha mesmo, valendo uma visita quando se estiver passeando pelo bairro.
Nossa idéia era seguir um roteiro do meu guia de Paris, uma caminhada de 90 minutos por Montmartre (jamais acredite no tempo dessas caminhadas, sempre demora muito mais do que diz o guia). O problema é que a principal atração do quartier não estava no roteiro, a Sacré Coeur, e ainda queríamos procurar uma mala para o Caike poder voltar com tudo o que havíamos comprado até então, portanto resolvemos fazer um desvio nos nossos planos e ver primeiro o cartão postal do bairro, a igreja.
Se tínhamos achado a Torre Eiffel e o Trocadéro uma farofada, era simplesmente porque ainda não tínhamos visitado Montmartre. A entrada para parque onde fica a igreja é lotada de camelôs, e de pessoas tentando tirar dinheiro dos turistas tentando mostrar "truques". O negócio é fingir que nem tá vendo nada e passar batido, no máximo pedindo um "pardon" e um "non, merci". Passando da barreira humana, você chega no próximo obstáculo: as escadas. São muitas e parecem intransponíveis. Mas acredite, não é tão difícil quanto parece, e qualquer coisa você pode se divertir escolhendo qual delas pegar (tem 2 centrais e mais 2 laterais, sendo que as laterais têm sombra!) e mudando de escada nos platôs, de onde se tem uma bela vista da cidade, que vai melhorando conforme se sobe.
Nos platôs também tem mais camelô, só que um pouco menos concentrado (o espaço é maior), e dessa vez artistas de rua: estátuas vivas, palhaços, malabaristas, músicos... tem pra todo gosto. Ainda mais no final de semana, que foi quando fizemos nossa visita. E no gramado novamente se pode ver os parisienses no seu dia a dia de verão: todos esparramados na grama, lendo, ou batendo papo em rodinhas regadas a comida e a vinho... só que como aqui o terreno é inclinado, faz menos sucesso que o campo de marte e outros parques da cidade, como vim a descobrir mais tarde.
Fomos subindo as escadas debaixo de um sol maravilhosamente quente, do qual eu estava sentindo falta por conta dos dias anteriores, escolhendo as laterais por conta da sombra proporcionada pelas plantas. Fizemos uma parada estratégica no platô anterior à igreja, que tem belíssimas fontes de água (usadas como piscina pelas crianças), onde sentamos e descansamos apreciando a bela vista da cidade. Obviamente aproveitamos a ocasião para tirar um monte de fotos, inclusive muitas tentativas frustadas de tirar auto-retratos com Paris ao fundo (minha técnica de auto-retrato evoluiu muito durante a viagem). E quando nos demos por satisfeitos, fomos enfrentar a fila para entrar na Sacré Coeur.
Essa igreja na verdade é uma basílica, construída por conta de um decreto de 1873 para expiar os pecados dos communards (participantes da comuna de Paris) derrotados em 1871. Sua construção demorou quase 40 anos para ser terminada, e ela só foi consagrada depois da primeira guerra mundial. Em forma de cruz grega, suas cúpulas lembram muito as de uma mesquita por conta do formato, e ela é muito branca por fora por conta da pedra utilizada, o que a deixa lindíssima num dia claro de céu azul, como o que demos a sorte de pegar. Porém ela é cheia de restrições, mais do que a Notre-Dame! É proibido tirar fotos do interior da igreja, mesmo sem flash, com direito a seguranças expulsando os turistas que quebram a regra! O que, depois pensando bem, nem é tão terrível assim, visto que como a grande catedral, essa basílica é muito mais bonita por fora do que por dentro. Deve ser karma das igrejas famosas de Paris. A única coisa digna de nota no interior da Sacré Coeur é o mosaico da cúpula principal, que chama atenção pelo seu tamanho, não necessariamente pela sua beleza.
Quando conseguimos entrar estava começando uma missa. Resolvemos sentar e ver, eu estava na esperança de ouvir uma missa polifônica ou um canto gregoriano... mas ao invés disso, era só o padre falando mesmo, as pessoas se acotovelando para visitar a igreja e turistas sendo expulsos por tirar fotos. Para piorar do meu lado sentou um autêntico francês... com um cheiro que perfume nenhum conseguia disfarçar. Esperamos até o máximo da nossa paciência para ver se tinha algum tipo de canto, e quando percebemos que ia ser só aquilo mesmo, discretamente nos levantamos e fomos embora.Decretamos então que era hora de começarmos nosso walking tour. Fomos direto para uma das maiores ruas do quartier, a Boulevard de Rochechouart, onde, logo percebemos, é a rua da Alfândega de Paris. Era ali mesmo que acharíamos a mala por um preço em conta. Entramos numa loja e perguntamos pela marca que o Caike queria, Samsonite. Não tinha. Continuamos andando e achamos outra loja, que também não tinha, porém a vendedora foi muito simpática e nos indicou um lugar que ela sabia que teria. Lá fomos nós atrás da tal loja, que conseguimos achar! E tinha a maior cara de loja do Saara... só que os produtos pareciam verdadeiros. Fomos para o segundo andar, onde ficavam os modelos Samsonite, e fomos atendidos por um francês/argelino muito simpático que arranhava português. Acabamos por comprar 2 malas, uma para o Caike, bem parecida com a que eu estava levando na viagem, só que de melhor qualidade, e outra para mim, só que dessas tipo sacolão, que eu queria guardar dentro da minha mala, porque meus instintos diziam que eu iria precisar de uma. Guardamos uma dentro da outra e partimos para conhecer as ladeiras do bairro mais boêmio de Paris.
Pela nossa localização começamos o tour no sentido contrário e do meio do caminho, o que complicou um bocado na hora da gente achar as ruas para entrar, mas conseguimos nos virar e ainda antes do almoço vimos o prédio onde funcionou o famoso Chat Noir (o teatro de sombras), o cinema mais antigo de Paris (e provavelmente do mundo, que hoje abriga um teatro), o primeiro cabaré de cancã do quartier, e uma das casas onde viveu Van Gogh! Diga-se de passagem, o holandês me perseguiu pela Europa... mas não vou adiantar a viagem.
Fomos seguindo o roteiro até o seu início, a Place Pigalle, descrita como um lugar animadíssimo! É realmente bastante cheia... é uma praça bem grande, com um sem número de restaurantes e mais algumas casas de "show", leia-se strip tease. Como estávamos carregando a mala a tiracolo (na verdade era o Caike que carregava a mala no ombro), achamos que ali nós teríamos um boa diversidade de lugares para escolher onde almoçar. Entramos num bistrô cujo menu na porta parecia atraente e sentamos. Entregaram o menu oficial e começamos e escolher... logo percebi que eu não estava gostando muito daquelas opções... puro mal-humor de cansaço, mas precisava descontar em algo, né? O menu não tão interessante era a melhor vítima. Então levantamos e saímos.
Fomos dando a volta pela praça e decidimos tentar novamente num bistrô com um jeitão bem alternativo, parecendo uma mistura improvável de comida francesa com indiana, um leve toque árabe e uns pratos bem orientais (chineses mesmo). Pra completar a bagunça cultural e fazer uma boa demonstração do que é a globalização estava tocando Seu Jorge no fundo, o que foi ótimo... eu já estava com saudade da música brasileira.
Enfim, era ali mesmo que mataríamos a fome, pegamos o menu com o garçon e foi aí que aconteceu o único incidente esquisito com garçons na França: ele nos entregou o menu com a comida e a carta de vinhos, mas nós estávamos cansados e não queríamos beber nada alcoólico, então eu pedi a ele o menu com as outras bebidas. Inconformado que alguém pudesse almoçar bebendo algo que não fosse vinho, ele mal educadamente me perguntou "afinal o que vocês querem, comer ou beber?", no que eu tive que responder controlando o meu mau humor com unhas e dentes que iríamos comer sim, mas não beberíamos nada com álcool. Ele olhou estranho, mas trouxe o outro menu. Pedimos pratos de massa tipo wok (é a panela usada para fazer yaksoba), eu pedi um suco de laranja de verdade (laranjas prensadas em francês) e o Caike pediu um capucchino gelado. Depois que já estava tudo resolvido o garçon não incomodou mais, só nos perguntou se queríamos sobremesa e ouvindo a negativa, perguntou se queríamos a conta. No meio desse processo ele levou um esporro do gerente, porque não tinha servido a nossa mesa de pão e água, coisa que outro garçon acabou por fazer atirando as coisas na mesa.
Por conta da localização da praça e pela experiência com o caminho inverso do guia, decidimos que era melhor fazer o tour pela direção certa, então andamos novamente pela Boulevard de Rochechouart e subimos novamente as ladeiras que dão na Sacré Coeur, mas dessa vez para encontrar a Montmartre bucólica e histórica. É nessa parte do bairro que se encontram os antigos e atuais estúdios dos artistas, construídos do século XIX até o início do século XX. Um dos primeiros que vimos foi de Picasso, que infelizmente pegou fogo, mas como era um conjunto de ateliers, ainda tem a entrada intacta. Esse "conjunto artístico-habitacional" fica no alto de uma escada que também proporciona uma bela vista, ponto imperdível.
Dali fomos seguindo o nosso circuito e novamente encontramos a farofada na place du Tertre, onde existe uma imensidade de bares disputando cada centímetro disponível, e as pessoas disputam as moléculas de oxigênio. Ali perto fica o museu do Montmartre, que parece bem pequeno por fora, além de ter um aspecto mambembe, que combina com o quartier. Como não parecia tão interessante assim, passamos direto. Também passamos em frente a um museu com muita cara de improvisado do Salvador Dali, que parecia menor ainda e estava com uma fila enorme na porta. Passamos direto também.
Dali seguimos para baixo, numa rua onde, dizia o guia, tinha o belo vinhedo de Montmartre, que nem é belo nem cara de vinhedo tem. Mas as casas em volta e a vista valem o passeio. A partir desse ponto até os antigos moinhos do bairro (existem ainda 2 para contar a história da época que o morro era apenas plantações, pintadas por, adivinha, Van Gogh), é cheio de ateliers de artistas vivos (porque Renoir, Van Gogh e Picasso são muito legais mas não produzem nada há anos), e chegamos a ver um conhecido dos pps da internet! Aquele que faz rostos com desenhos de livros abertos, capas e lombadas... inclusive ele estava lá dentro, lendo um livro.
No mesmo caminho passamos pela casa onde viveu a cantora Dalida, nascida no Egito e de origem italiana, famosérrima no meio da música árabe (foi a precursora na Europa cantando em francês, árabe, espanhol, italiano, inglês...) e da chanson française, mas cuja vida foi cheia de altos e baixos, o que a levou a se jogar da janela de sua casa em Montmartre em 1987. Numa pequena praça bem perto dessa casa há um belíssimo busto em sua homenagem, onde, é claro, tirei uma foto.
A partir daí é só descida até a rua do Moulin Rouge, que só havíamos visto à noite e onde tiramos fotos dessa vez, que é entupida de sex shops e de casas de "show" provavelmente mais quentes do que o moinho vermelho. Assim, terminamos o nosso tour pela boemia e fomos providenciar o jantar. Como o bairro é mais residencial achamos facilmente uma padaria, onde compramos uma bisnaga enorme, e uma loja de queijos. Como eu adoro queijo mofado e o Caike gosta de Camembert e de Brie, achamos que dava pra arriscar alguns queijos mais franceses que fossem mais "frescos". Entramos e escolhemos uns 3 tipos de queijo bem branquinhos... porque tinha uns que simplesmente não davam, de tão pretos ou verdes ou azuis, e fomos para a nossa sessão mala.
Chegando no hotel, fiz uma aposta com o Caike, que eu obviamente ganhei, de que conseguiria colocar tudo na mala nova dele. Com tudo fechado analisamos o peso dela e percebemos que não ia dar certo, porque era óbvio que ela tinha mais do que os 20 quilos que a Ibéria permitia. Então, dividimos o peso na mala nova e na mochila de camping velha. Aí foi a minha vez de fazer mala, que ficou bem razoável, pois a idéia era fazer uma mochila pequena para dormir apenas um dia fora e eu deixaria o resto das coisas no hotel mesmo, para onde eu voltaria e ficaria num quarto single.
Descemos e pagamos a conta, porque não daria pra fazer isso às 5 horas da manhã, quando o Caike iria pro aeroporto. Depois fomos jantar! Abrimos os queijos... e o quarto se tornou insuportavelmente fedorento. O cheiro era tão forte que o Caike nem conseguiu experimenta-los, ficando a tarefa de acabar com eles pra mim. Fiz um enorme esforço e consegui comer um pouco menos da metade, junto com o vinho. Deixamos tudo pronto para a correria da despedida e fomos dormir o pouco que dava.

2 de maio - o dia que matou os pés

Nesse dia fizemos um esforço e acordamos ainda mais cedo que no dia anterior, pois a programação era extensa e começava mais cedo que o normal. Por conta da hora tomamos café da manhã no quarto mesmo, e no escuro, pois faltava luz em Paris. Na Europa eles também sofrem com esses problemas comuns, com a diferença de que eles são resolvidos mais rapidamente. Quando saímos já estava tudo de volta ao normal.
Pegamos o metrô morrendo de sono, mas eu estava ansiosa, a nossa primeira parada era o cemitério Père Lachaise, um lugar que eu morria de vontade de conhecer. Não é exatamente um ponto turístico comum, mas mesmo assim é muito famoso e muito frequentado, inclusive por parisienses, especialmente por namorados. Dá logo pra perceber que não é um cemitério comum, né? Apesar de eu gostar de visitar cemitérios comuns... costumam ser bonitos e muito calmos.
Para facilitar a vida, antes da viagem eu imprimi um mapa do cemitério com a localização de todos os túmulos que eu queria visitar, o que foi a maior mão na roda, porque não há mapas disponíveis na entrada. Mas uma das lojas de flores perto do portão principal vende um guia por uns 2 euros, o que é um absurdo.
Chegamos lá, pra variar, antes dele abrir. No meu guia o horário de abertura estava errado, dizendo que abria às 7h quando, na verdade, abria meia hora depois. Ficamos na porta principal, batendo papo e observando Paris acordar bem lentamente. Quando ouvimos o vigia chegando, com o característico barulho do molho de chaves. Ouvimos a fechadura sendo destrancada e a porta se abriu devagar, fazendo aquele barulho de madeira que dá nos nervos típico de filme de terror. E no fundo o som dos corvos... ficamos arrepiados e por um instante exitamos, entrávamos ou não? Respiramos fundo e fomos em frente.
A entrada principal dá para uma grande avenida com o monumento aos mortos no fim, que é muito bonito e comovente. Éramos os únicos andando por ali, e fomos invadidos por um sentimento estranho, uma espécie de respeito profundo por aqueles ali enterrados. Logo percebemos que não conseguiríamos tirar nenhuma foto, essa seria uma experiência que seria nossa, apenas nossa. Cada um tem que ir por si mesmo visitar aqueles que lhe tocaram a alma e descansam nesse lindo lugar.
Começamos pelo monumento do pintor Théodore Géricault, que é belíssimo, com uma placa de ferro que contem uma cópia do seu quadro mais famoso, "Le radeau de la méduse". Perto do seu túmulo tem mais um artista romântico, Frederic Chopin, com sua tomba coberta de flores trazidas pelos fãs, que até hoje são numerosos, e com uma linda estátua de uma mulher que sofre por sua perda com uma partitura no colo.
Dali fomos atrás de mais um músico, só que mais moderno, Jim Morrison. O rebelde que morreu de overdose em Paris atrai multidões para o seu túmulo, que de tanto ser vandalizado pelos fãs (rebeldes também, é claro) é cercado por uma grade com um cartaz de proibido passar. Mas isso não impede as pessoas de chegarem mais perto e cobrir a tumba de velas pretas e vermelhas, break on through to the other side!
Dali continuamos no mundo da música popular, só que francesa, visitando uma grande estrela da chanson française, Édith Piaf, de quem eu nunca realmente gostei da obra, mas me apaixonei pela pessoa vendo o filme Hino ao Amor. Seu túmulo é difícil de achar, porque traz o nome da família Gassion - Piaf (esse último nome é apenas artístico e significa pardal) e o nome real da artista Édith Giovanna Gassion. Ele é coberto de flores e placas de homenagem dos fãs e fotos, uma coisa muito emocionante de ver.
Dali fomos visitar um lugar histórico dentro do cemitério, o muro dos federados da comuna de Paris. Esse importante movimento, considerado por Marx a primeira insurreição proletária da história, pode ser resumido como a tomada do poder da cidade de Paris pelo povo. Esse movimento durou uns 2 meses, terminando na semana sangrenta, quando o governo invadiu Paris com a ajuda dos exércitos de outros países e matou quase todos aqueles que participaram da Comuna. Um dos últimos momentos da insurreição se passou no cemitério, onde se deu uma das últimas batalhas e a mais famosa execução sumária dos communards, que ocorreu durante a noite, onde 147 deles foram executados a tiros e enterrados numa vala comum ao pé do muro. Hoje há uma placa no local, em homenagem aos mortos daquela noite, e é um dos poucos lugares do cemitério sem túmulos. E até hoje o partido comunista e várias pessoas de esquerda deixam flores (cravos vermelhos na sua maioria) ao pé do muro e nas suas saliências. Para deixar ainda mais tocante, é nessa área do cemitério que se encontram os monumentos aos mortos da primeira e da segunda guerras mundiais, uma profusão de homenagens àqueles que morreram por suas convicções que deixa os olhos cheios de lágrimas.
Emocionados, continuamos nosso tour para o próximo túmulo que queríamos visitar: Oscar Wilde. Sua tumba é na verdade uma esfinge em pleno vôo, coberta de beijos pelas visitantes. Sua fama de dar sorte no amor (e na cama) leva as mulheres a beijarem o monumento e até o pênis da estátua foi furtado. A persistência feminina (eu acho, pode ser que tenha homens no meio também, né?) é tão grande que mesmo com uma placa pedindo que as pessoas não beijem o túmulo, que precisa ser sistematicamente limpo, ele está repleto de marcas de batom, que se intensificam em número conforme ai chegando perto dos órgãos sexuais. Uma loucura! Aproveito para avisar: não beijei o túmulo! Acho isso nojento!
Dali fomos visitar uma pessoa muito especial para mim, que foi cremada e por isso se encontra num carneiro no centro do cemitério, onde fica o crematório: Isadora Duncan. Minha idéia era dançar na frente do seu túmulo em homenagem à bailarina que quebrou as regras do balé clássico. Infelizmente havia um enterro acontecendo no crematório, e por conta das pessoas chorosas e vestidas de preto eu fiquei sem graça de sair dançando. De qualquer forma fiquei emocionada com essa visita, pois não imaginava que a tumba da Isadora fosse tão simples, e é uma das poucas sem flores, há apenas uma frase escrita com canivete na pedra sobre a dança. Os bailarinos se expressam de forma mais etérea mesmo. Foi o único lugar que eu tirei foto no cemitério, o que é engraçado, visto que existem poucos registros visuais dessa bailarina, e apesar de já existir cinema na sua época, não há filmes da sua dança.
No mesmo local estão as cinzas de mais uma artista, Maria Callas, a famosa cantora de ópera. Começamos a procurar pelo seu carneiro, e eu cheguei a me animar quando ouvi uma visitante cantando ali perto, mas não conseguimos achar. Procuramos em todos os cantos mas Maria Callas resolveu se esconder.
Acabamos por desistir dela e fomos atrás de homens das letras, Marcel Proust e Guillaume Apollinaire. Novamente tivemos dificuldade em encontrar os seus túmulos, mas pelo menos conseguimos achá-los. Eles ficam bem no meio das divisões, o que dificulta muito a localização, pois você tem que andar por entre as tumbas para encontrá-los, e elas são muito grudadas umas nas outras, para passar é muito complicado. Em algumas ocasiões é necessário pisar em algumas, o que dá uma sensação muito desagradável.
Dali fomos procurar mais um ídolo da chanson française, Îves Montand, que está enterrado junto ao grande amor de sua vida, Simone Signoret, sua primeira esposa. Seu túmulo também está cheio de flores e declarações dos seus fãs. Muito bonito.
Perto dele está outra celebridade, mas de natureza religiosa, Allan Kardec. Quando chegamos uma mulher estava prestando homenagem ao criador do espiritismo, colocando mais um vaso de flores no já lotado túmulo. Aliás, esse é um dos túmulos mais interessantes do cemitério, pois está coberto de frases famosas de Kardec sobre a morte, a vida e a reencarnação. Fiquei um tempo lendo todas elas, todas muito oportunas naquele lugar.
Nossa próxima parada foi tentar encontrar Sarah Bernhard, a famosa atriz. Mas depois de Isadora Duncan, não conseguimos mais achar nenhuma mulher, procuramos exaustivamente por ela sem sucesso. Entramos por diversos lugares e passamos por cima de diversos túmulos, mas nada adiantou.
Acabamos por desistir dela também e fomos para um novo desafio: encontrar os túmulos de Jean de la Fontaine (o escritor de fábulas) e de Molière! Pelo mapa, eles estavam enterrados juntos, e começamos nossa procura, tendo que novamente nos embrenhar pelo meio das tumbas. Chegamos a encontrar um túmulo com jeito muito antigo, com os nomes muito apagados na lápide, e um deles tinha o sobrenome de la Fontaine, mas não tinha Molière. Ficamos na dúvida, será que era aquele mesmo? Continuamos a busca e acabamos por encontrar o lugar certo, que é de honra, pois tem até um cercado envolta das tumbas, de formato bem clássico e até austero. Fiquei surpresa pela falta de flores e de homenagens... talvez eles sejam antigos demais pra isso. Mas quando saímos de lá um grupo de jovens de outro país chegou mais perto e nos perguntou se falávamos francês, eu disse que eu falava, e eles estavam a procura justamente do túmulo de Molière, o autor ainda tinha admiradores jovens. Feliz mostrei no meu mapa e expliquei como chegar lá, eles agradeceram e perguntaram onde poderiam conseguir um mapa também. Disse-lhes que havia trazido de casa, e eles ficaram meio decepcionados, pois andar naquele cemitério sem um guia é pedir pra se perder e se cansar mais do que o necessário, já que o solo é muito irregular e é preciso subir e descer ladeiras o tempo todo.
Deixamos os jovens seguirem o seu caminho e continuamos nosso tour, a próxima visita seria a Dominique Ingres, um dos pintores orientalistas que eu adoro. Seu túmulo não é artístico como o de Géricault, mas também é comovente. Perto dele está outro pintor renomadíssimo, Eugène Delacroix, cuja obra romântica é belíssima, e também criou muitas obras orientalistas importantes.
Já estávamos cansados, e agora só faltava uma pessoa para visitar, Georges Mélies, um dos primeiros cineastas da história, e o primeiro a utilizar efeitos especiais, quando o cinema ainda engatinhava e era mudo. Seu túmulo também carece de flores e não é exatamente fácil de encontrar, mas seu busto é um dos mais interessantes do cemitério, pois ele é retratado sorrindo.
Finalmente saímos do Père Lachaise, encantados com a nossa visita, que havia durado muito mais do que tínhamos programado. Já era quase hora do almoço e a programação do dia extensa. Pegamos uma avenida principal e andamos rápido, dando apenas para observar que o bairro onde estávamos era bem mais residencial que os que tínhamos conhecido até então, com muitas mulheres empurrando carrinhos de bebês (a maioria deles duplo, mas com crianças que nem pareciam irmãs dentro, o que me faz desconfiar de que se tratavam de babás), muitos idosos caminhando lentamente e fazendo compras numa das inúmeras lojas de comida, principalmente queijarias, padarias e pequenos comerciantes de frutas e legumes da região.
Seguindo a tal avenida terminamos por chegar na Place de la Bastille, onde um dia esteve a famosa prisão do regime monárquico, queimada pelas forças revolucionárias. Hoje há um grande monumento em memória aos cidadãos franceses que participaram dos "memoráveis dias 27, 28 e 29 de julho de 1830", com uma espécie de anjo dourado no topo. É uma imagem muito famosa da cidade. E aproveitamos para tirar as primeiras fotos de verdade do dia, com direito a pagação de mico típica de turista, daquelas que as pessoas param para olhar e segurar o riso.
Na praça estava acontecendo uma grande feira de arte também, mas tínhamos ainda muita coisa pra ver e resolvemos passar longe da confusão. Enquanto dávamos a volta necessária para continuar nosso caminho, passamos na frente de um bistrô com um jeitão muito simples, mas que tinha um menu completo por um preço muito tentador. Como já era meio dia, o lugar tinha acabado de abrir e por isso estava vazio, achamos que seria um bom momento para pararmos e almoçarmos logo de uma vez. Nossas pernas já estavam doloridas e ainda queríamos visitar dois museus, seria bom fazer uma parada estratégica.
Sentamos e pedimos nossos pratos, além de uma taça de vinho rosé para mim e uma cerveja para o Caike. A comida foi uma das mais simples que comi em toda a viagem, mas estava razoável, se comparada com o que se vê em restaurantes brasileiros estava muito acima da média.
Terminado o almoço, continuamos num passo apertado até o Institut du Monde Arabe, que já tínhamos passado em frente, mas agora iríamos visitar. É uma construção ultra-moderna, com painéis ajustáveis que deixam passar a exata quantidade de luz para iluminar o interior e por dentro muita coisa é de vidro, de forma que você consegue ver o hall de entrada muitos andares acima do solo. O Caike quase desistiu de ver as exposições quando perceber que teria que andar vendo a altura em que estava (as exposições ficam nos andares mais altos), mas se convenceu quando viu que só o corredor central tinha esse problema, era só evitar olhar para o centro enquanto usávamos as escadas.
Começamos nossa visita indo para o subsolo, onde tem uma loja de produtos árabes. Eu procurava lenços de moedas, cds e dvds. Tinha isso tudo, mas os lenços era tão caros quanto aqui, então não valiam a pena, os cds também, apenas alguns dvds de festivais de dança no Egito estavam com preços aceitáveis e eu acabei comprando 3. De lá subimos direto para a exposição permanente, que não precisamos pagar para ver por conta do sagrado museum pass, e que ocupa uns três ou quatro andares do instituto, valendo muito a pena ser visitada se você gosta de arte islâmica. Ela é organizada em ordem cronológica e por temas, e contem quase todo tipo de artefato, desde fragmentos de vasos e pratos de cerâmica, até tapetes e roupas, além de muitas iluminuras do Corão, é claro. Tudo belíssimo. Uma das partes mais interessantes é sobre os árabes e a ciência, que tem muitos astrolábios interessantíssimos, relógios e livros de matemática. Eles eram mesmo muito avançados até pouco depois das cruzadas, quando resolveram se fechar para o mundo.
Saindo da exposição eu carreguei o Caike para a livraria. Eu sabia que seria uma tentação louca, mas também não podia deixar de visitar e ver que preciosidades eu poderia encontrar. Resisti à tentação das sessões de contos e literatura e fui direto para o que eu sabia ser a maior raridade para uma bailarina de dança do ventre: a parte de livros sobre música árabe. Ali acabei comprando 3 livros sobre música, com estudos maravilhosos e que provavelmente jamais serão publicados no Brasil. Enquanto eu me perdia entre as letras, o Caike me puxou e disse: Eu acho que eu não devia fazer isso e provavelmente vou me arrepender, mas sei que você vai gostar, então vem cá. Eu o segui e ele me mostrou a sessão de cds. Era tão grande e tão bem classificada que meu queixo caiu. Ele virou novamente pra mim, "promete que vai ser rápida?", eu fiz que sim com a cabeça, deixei os livros com ele e freneticamente comecei a ver os títulos classificados em danse orientale. Todos pareciam ser maravilhosos e a minha vontade era de levar tudo pra casa, mas nenhum deles estava em promoção, e, portanto, estavam caríssimos. Foi o que me fez conseguir sair de lá sem estourar o cartão de crédito, pois acabei por só comprar os livros, repetindo como um mantra para mim mesma que eu já tinha comprado mais de 10 cds na fnac e na loja que visitamos ali perto dias antes e eles eram mais do que suficientes.
Finalmente conseguimos sair do instituto e nos dirigimos para o museu Cluny. No meio do caminho, ao percebermos que estávamos próximo da Notre Dame, e que estávamos dentro do horário, resolvemos dar uma volta um pouco maior e visitar a cripta da Notre Dame, que estava fechada quando tentamos visitar.
Chegando lá, mostramos nosso museum pass e entramos. A cripta na verdade é uma grande escavação que mostra as fundações dos primeiros prédios da île de la Cité, quando a cidade ainda se chamava Lutécia, e vai mostrando as diversas fases de edificação da ilha até a primeira igreja que depois foi substituída pela catedral. Uma exposição realmente impressionante, com as escavações bem iluminadas e identificadas, de forma que dá pra brincar com os luzes e ir acendendo cada pedaço de uma vez, facilitando a identificação das ruínas. Muito legal de visitar, mesmo.
Tomando conta para não perdermos a hora, saímos da cripta e fomos direto para o museu de arte medieval Cluny. Esse museu fica num prédio muito antigo, que contem no seu subsolo as ruínas das termas romanas de Lutécia, uma das mais bem conservadas da França, e cuja arquitetura é predominantemente gótica. O prédio, na verdade, era a abadia de Cluny e foi nacionalizada durante a revolução francesa, sendo dividido entre muitos proprietários particulares. No meio do século XIX, Alexandre du Sommerard se instala e lá coloca sua coleção de arte, que acaba sendo tomada pelo governo, que tomba a construção e abre o museu.
A entrada já chama muita atenção, com muitos arcos com detalhes góticos, uma torre com um relógio de sol e um velho poço. Dali se entra no museu, começando a exposição justamente pelas galerias do subsolo, repletas de placas de pedra esculpidas do período gallo-romano e esculturas vindas das diversas reformas da Catedral de Notre-Dame. Dali se segue para as salas das termas, que estão absurdamente bem conservadas, porém muita coisa estava em reforma, de modo que não pudemos ter uma melhor visão da grandiosidade da construção romana.
Dali se segue para a parte de estátuas da idade média, com muitos santos em madeira e pedra. Todos belíssimos. E assim você vai se preparando para ver um dos carros-chefe do museu, a coleção de 6 tapeçarias medievais conhecida como A Dama e o Unicórnio. É uma coleção lindíssima, com as cores ainda vivas, e que segundo um livro que eu li (Maria Madalena e o Santo Graal) é uma alegoria mostrando que Madalena é o Santo Graal.
Depois temos ainda mais estátuas de santos, predominantemente de Maria Madalena e Nossa Senhora, e então se chega na capela da abadia de Cluny. Essa capela de estilo gótico é linda de morrer, o teto é todo trabalhado em pedra, mais parecendo uma teia de aranha de tantos detalhes e nervuras. As paredes são apinhadas de arte religiosa do acervo do museu, dando a sensação de que se está numa capela mesmo e não num museu.
A sala seguinte já tem um tema quase inverso, mas que tem muito a ver com a religião católica e a sua história: as armas medievais. É o máximo ver todas aquelas armaduras, maças, lanças, espadas e arcos e flexas, muitos dos quais estão muito bem conservados.
Acabamos de ver a exposição quase na hora do museu fechar, e quando saímos demos de cara com uma loja que estávamos namorando há alguns dias, mas que estava sempre fechada quando passávamos em frente. Dessa vez ela estava aberta! Entramos e nos perdemos no paraíso nerd: uma loja repleta de figuras de Guerras nas Estrelas, mangás e desenhos animados, além de uma sessão enorme de quadrinhos e de mangás. Como não iríamos comprar nada, tiramos algumas fotos com alguns ítens interessantes. Até que o Caike viu uma caneca do Snoopy e não resistiu. Enquanto ele se segurava para não levar mais nada, eu achei um livro em inglês do Calvin e Haroldo, e ele novamente cedeu ao consumismo. Resolvemos então que era melhor parar de procurar coisas e ir embora.
Dali, carregados e felizes, fomos para a Torre Eiffel, dessa vez iríamos enfrentar a fila e subir, pois não podíamos deixar de visitar o cartão postal mais famoso de Paris. E a fila era grande mesmo. Dava voltas e voltas em si mesma. Uma coisa desanimadora para quem está cansado de andar o dia todo.
Enquanto o Caike foi para a fila eu fui para a lanchonete providenciar o nosso "jantar". E comemos de pé mesmo, enquanto observávamos os turistas de todo o mundo passando de um lado para o outro. Eu estava esgotada, e bem desanimada pelo cansaço, o Caike vendo o meu estado, disse que ficava na fila e que eu podia ficar sentada num dos bancos debaixo da torre para descansar, já que eu precisava estar em forma para animá-lo quando ele tivesse vertigem lá em cima. De muito bom grado aceitei a proposta, e fui mudando de banco conforme a fila andava para ficar mais perto possível dele.
Depois de mais de duas horas de espera chegou a nossa vez de comprar os ingressos. Compramos para ir até o terceiro e último andar, e dali fomos para a fila seguinte, a do elevador. A diferença é que ali já não há mais organização nenhuma, é só empurra empurra mesmo, bem do jeito que o francês gosta.
O elevador é original, da época da construção da torre, portanto ele é lerdo, absurdamente lerdo. Demora uns 15 minutos entre uma subida e outra, deixando todo o processo muito lento. Fomos direto para o segundo andar, onde é preciso trocar de elevador para chegar no terceiro, como já estava tarde fomos direto para a fila, que quase que dá a volta na torre, de forma que os turistas que não vão subir mais ficam pedindo para passar e tirar foto da beirada da varanda. O Caike, coitado, já estava nervoso ali, e ficou o tempo todo com a mão em alguma pilastra para dar um pouco de sensação de segurança. Já eu me animei com a vista da cidade que eu sonhava em visitar há 10 anos e nem sentia mais as pernas reclamando, apesar de ter abusado delas durante o dia inteiro.
O segundo andar da torre já é mais alto que o Arco do Triunfo e não possui grades, fora que o chão é levemente inclinado para fora, dando uma sensação meio estranha mesmo. E ainda tem o vento frio, já que era quase oito horas da noite e o sol iria se pôr em pouco tempo, deixando a temperatura mais baixa.
Depois de mais uns 30 minutos na fila entramos novamente no elevador, indo para o último andar, que pelo menos tem grades na varanda, e uma escada que dá para uma micro sala, praticamente no topo da torre, com uma vista magnífica da cidade. Nesse ponto é tão alto e venta tanto que a sala é toda fechada com vidro para proteger os visitantes. Ali, o Caike resolveu que a parede era o melhor lugar pra ficar, enquanto eu me expremia contra o vidro para tirar as melhores fotos possíveis do pôr do sol, um espetáculo belíssimo numa cidade fantástica que começava e se iluminar.
Quando já estava praticamente escuro e não dava mais para fotografar direito, cedi aos apelos do Caike para irmos embora. Pelo menos para descer tinha menos fila, pois já estava tarde e a maioria das pessoas já tinha ido embora.
Chegamos ao solo quando já era noite fechada, e fomos direto para o metrô, pois nossos pés estavam pedindo arrego e nós estávamos além da exaustão. Chegando no hotel eu ainda fui lavar roupa antes de dormir e depois capotei num sono tão pesado que nem sonhei. Mas também, quem precisa sonhar a noite quando passou o dia inteiro num deslumbre só?